
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, determinou uma acareação entre Daniel Vorcaro, ex-presidente do BRB, e Aílton de Aquino Santos, diretor do Banco Central responsável pelo relatório que bloqueou a venda do Banco Master. A audiência acontecerá na próxima terça-feira, dia 30 de dezembro, às 14 horas, por videoconferência. O procedimento será realizado em sigilo absoluto, com um juiz do gabinete de Toffoli conduzindo os trabalhos.
Segundo especialistas jurídicos, essa acareação não tem precedentes na história judicial brasileira e não possui previsão legal específica. O mais estranho é que ela foi determinada de ofício pelo próprio ministro, sem provocação da Polícia Federal ou do Ministério Público. É como se Toffoli estivesse agindo como investigador do caso, elaborando as perguntas que serão feitas durante o confronto de versões.
A operação original previa que o BRB, banco estatal do Distrito Federal, comprasse parte das ações do Banco Master. Todo mundo sabia que o Master já estava com problemas sérios, mas mesmo assim queriam empurrar o passivo para o banco público. Ou seja, o prejuízo ficaria nas costas do contribuinte, como sempre acontece quando o Estado resolve “salvar” instituições privadas quebradas.
O Banco Central, felizmente independente desde a gestão Bolsonaro, vetou a operação em setembro de 2025. Depois decretou a liquidação judicial, quando a Polícia Federal descobriu indícios de fraudes de 12,2 bilhões de reais no sistema financeiro. Agora as forças políticas de Brasília querem reverter essa decisão técnica na base da pressão e interferência.
Banco Central independente frustra esquema de socialização de prejuízos
A independência do Banco Central, conquista do governo Bolsonaro, está sendo fundamental nesse caso. Aílton de Aquino Santos, o diretor que assinou o relatório contrário à venda, tem mandato até 2027. Mesmo que Lula não goste da decisão, não pode demitir o diretor. Antes dessa independência, qualquer presidente poderia trocar a diretoria do BC quando não gostasse das decisões técnicas.
Inicialmente, Aílton era favorável à operação de venda do Master para o BRB. Outro diretor, Renato Dias Gomes, mostrava resistência desde o início. Mas quando chegou a hora de elaborar o relatório final, foi o próprio Aílton quem recomendou o bloqueio da venda. O documento foi votado no plenário da diretoria do BC e aprovado por unanimidade.
Essa mudança de posição de Aílton pode ter irritado quem esperava que ele facilitasse a operação. Agora ele está sendo chamado para uma acareação atípica, fora de qualquer procedimento padrão da Justiça brasileira. A pressão é evidente: querem que ele admita algum erro ou justifique sua decisão técnica perante interesses políticos.
O timing também chama atenção. A acareação foi marcada para véspera do Ano Novo, em pleno feriado judiciário, quando a atenção da imprensa e da sociedade está voltada para outras coisas. Tudo em sigilo, longe dos olhos do público que paga as contas quando essas operações dão errado.
TCU e outras pressões para desfazer liquidação do Master
Um ministro do Tribunal de Contas da União também entrou na jogada, alegando “indícios de precipitação” na liquidação do Banco Master. Pediu explicações ao Banco Central e questionou a decisão técnica da autarquia. Mas aqui tem um problema: o TCU fiscaliza gastos da União, não do Distrito Federal. O BRB é banco do DF, então não deveria ser assunto do TCU.
Essa interferência mostra como o sistema está articulado para tentar reverter a liquidação. Querem que o BC volte atrás na decisão e permita algum tipo de salvamento do banco quebrado. O contribuinte, como sempre, seria chamado para pagar a conta de uma instituição privada mal administrada.
Mas existe um problema prático nessa estratégia de salvamento tardio. Ninguém mais confia no Banco Master depois de tudo que aconteceu. Mesmo que consigam desfazer a liquidação na base da pressão política, o banco vai quebrar logo em seguida por falta de credibilidade no mercado.
Quando um banco é liquidado e depois “desliquidado” por interferência política, ele perde definitivamente a confiança dos clientes e investidores. É como tentar colar um vaso quebrado: pode até grudar, mas nunca mais será o mesmo. E aí a quebra posterior pode ser ainda mais devastadora para o mercado financeiro.
Conexões suspeitas e reuniões em sigilo
A agenda oficial de autoridades do Banco Central revela coincidências interessantes. No dia 14 de agosto de 2025, mesmo dia em que Alexandre de Moraes teve reunião com Roberto Campos Neto para tratar “de assuntos institucionais”, Aílton de Aquino dos Santos também teve audiência com Daniel Vorcaro e Augusto Lima, CEO do Banco Master, em Brasília.
A reunião de Aílton foi oficialmente para “tratar de assuntos institucionais”, mas estava claramente relacionada ao Banco Master. Ou seja, no mesmo dia em que Moraes conversava com a cúpula do BC, o diretor responsável pelo caso Master recebia os executivos do banco em seu gabinete. Coincidência? Difícil acreditar.
Essas reuniões em sigilo, sem transparência para a imprensa e sociedade, levantam suspeitas sobre o tipo de pressão que vem sendo exercida sobre os técnicos do Banco Central. O fato de Moraes estar envolvido nas articulações em torno do Master não é segredo para ninguém que acompanha o caso.
Agora Toffoli entra na jogada com essa acareação atípica, determinada sem provocação dos órgãos de investigação competentes. É como se o próprio STF estivesse conduzindo uma investigação paralela, pressionando o diretor do BC a mudar sua posição técnica sobre o caso.
Buraco financeiro pode ser muito maior que imaginávamos
Oficialmente, o rombo do Banco Master está estimado em 41 bilhões de reais negativos. Mas os números reais ainda não foram divulgados pelo interventor que está cuidando da liquidação. Essa demora em apresentar os dados completos gera desconfiança sobre o tamanho real do problema.
O desespero das autoridades para reverter a liquidação pode indicar que o buraco é muito maior do que se imagina. Talvez temam que quando os números verdadeiros saírem, o impacto no mercado financeiro seja devastador. Por isso a pressa em desfazer a liquidação antes que a auditoria complete seu trabalho.
Existe também a possibilidade de que outras instituições financeiras estejam expostas ao Banco Master de formas ainda não reveladas. Se for esse o caso, a quebra definitiva do Master pode provocar um efeito dominó no sistema financeiro nacional, atingindo bancos que parecem saudáveis hoje.
Por isso tanta gente poderosa em Brasília está mobilizada para salvar o Master. Não é altruísmo ou preocupação com os clientes do banco. É medo de que a quebra definitiva revele conexões e prejuízos que preferem manter em sigilo.
STF vira investigador e abandona função constitucional
O comportamento de Toffoli neste caso repete o padrão que já vimos com Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. Ministros do STF que abandonam sua função constitucional de julgar para se tornarem investigadores, promotores e articuladores políticos. Isso não é normal nem saudável para a democracia.
A acareação determinada por Toffoli usurpa as funções da Polícia Federal e do Ministério Público. Quem deve investigar crimes e confrontar versões são os órgãos técnicos especializados, não ministros do Supremo agindo por conta própria. Mas parece que no Brasil de hoje tudo vale quando se quer proteger certos interesses.
O juiz de instrução do gabinete de Toffoli que vai conduzir a acareação receberá as perguntas elaboradas pelo próprio ministro. Ou seja, Toffoli define o que quer saber e como quer perguntar. É ele quem dita os rumos da “investigação”, como se fosse delegado ou promotor do caso.
Cadê o Procurador-Geral da República Paulo Gonet nessa história? Deveria ser ele conduzindo esse tipo de procedimento, não um ministro do STF. Mas Gonet parece estar de férias ou preferindo não se meter em mais uma confusão envolvendo o sistema financeiro e interesses políticos de Brasília.
Mercado livre versus socialização de prejuízos estatais
Este caso do Banco Master ilustra perfeitamente como funciona o capitalismo de compadrio no Brasil. Quando bancos privados dão lucro, o dinheiro fica com os donos. Quando dão prejuízo, querem empurrar as perdas para bancos estatais, ou seja, para o contribuinte pagar.
Se o BRB tivesse comprado o Master como planejado, o rombo de dezenas de bilhões viraria problema do erário público. Os executivos do Master continuariam ricos, os políticos ganhariam suas comissões por viabilizar a operação, e o povo pagaria a conta no final das contas através dos impostos.
A decisão técnica do Banco Central de barrar essa operação foi correta e corajosa. Impedir que prejuízos privados sejam transferidos para o setor público é exatamente o tipo de decisão que instituições independentes devem tomar, mesmo sob pressão política intensa.
Mas agora vem o STF tentando reverter uma decisão técnica correta através de pressão judicial. É a politização completa de uma questão que deveria ser tratada pelos critérios do mercado e da técnica bancária, não por interesses de gabinete em Brasília.
Lição sobre independência de instituições técnicas
A independência do Banco Central está sendo testada neste caso do Master. Se os diretores cederem à pressão e mudarem suas posições técnicas por causa de acareações atípicas e interferências políticas, a conquista da autonomia do BC terá sido em vão.
Instituições técnicas precisam tomar decisões baseadas em critérios objetivos, não em pressões de autoridades políticas ou judiciais. O mercado financeiro só funciona bem quando existe previsibilidade e critério nas decisões regulatórias. Interferência política gera instabilidade e desconfiança.
Aílton de Aquino Santos está numa posição difícil, mas sua resposta nesta acareação vai definir se a independência do BC é real ou apenas decorativa. Se ele mudar seu relatório técnico por causa da pressão, estará sinalizando que as decisões do BC podem ser revertidas na base do constrangimento político.
Por outro lado, se mantiver sua posição técnica e resistir às pressões, estará defendendo não apenas a independência do Banco Central, mas o próprio princípio de que decisões técnicas devem ser baseadas em critérios objetivos, não em interesses políticos ou corporativos.
O Brasil precisa de instituições fortes e independentes, capazes de dizer “não” quando necessário, mesmo sob pressão intensa de grupos poderosos. A liquidação do Banco Master foi uma dessas ocasiões em que a técnica prevaleceu sobre a política. Agora vamos ver se essa vitória será preservada ou revertida nos gabinetes de Brasília.
Esta acareação de Toffoli pode ser um divisor de águas. Ou confirma que as instituições técnicas brasileiras conquistaram independência real, ou revela que continuamos no mesmo sistema de sempre: quando interesses poderosos estão em jogo, a pressão política sempre vence a decisão técnica.
E você, acredita que o Banco Central vai resistir a essa pressão toda, ou acha que no final das contas o Banco Master ainda será salvo às custas do contribuinte brasileiro?

