
A prata bateu máximas históricas e acumula alta de 127,5% em 2025, superando até mesmo o ouro. A onça da prata chegou próxima aos US$ 50 nas últimas semanas de dezembro, após tocar US$ 75,14 no dia 26 de dezembro. O crescimento é extraordinário: até maio, o preço se mantinha estável, mas a partir daí começou uma escalada que explodiu no final do ano.
Nota editorial: Este conteúdo tem caráter analítico e opinativo, baseado em debates públicos e fontes abertas. Não afirma como fatos comprovados condutas ilegais ou ilícitas. Seu objetivo é promover reflexão crítica sobre temas de interesse público.
China no centro da tempestade: restrições que mudam tudo
A partir de 1º de janeiro de 2026, apenas empresas autorizadas poderão exportar prata da China. Para obter a licença, será necessário cumprir requisitos rígidos, como produção anual mínima de cerca de 80 toneladas e linhas de crédito amplas. É uma mudança radical que concentra o poder nas mãos de poucas empresas estatais chinesas.
Mas aqui está o problema: embora a China seja responsável por uma fatia considerável do mercado global, ela não é o player dominante como no antimônio ou nas terras raras. Analistas estimam que a China é responsável por 60 a 70 por cento da oferta global de prata. Mesmo assim, o México continua sendo o maior produtor mundial, seguido pela China em segundo lugar.
A questão é que a China exportou volumes recorde de prata para o Reino Unido, o que reduziu os stocks da Bolsa de Xangai para mínimos de mais de uma década. Isso criou um desequilíbrio físico no mercado que amplificou a volatilidade.
O plano da China de restringir as exportações de prata a partir de 2026 poderia perturbar uma importante fonte de abastecimento global, mas críticos apontam que o timing da explosão dos preços sugere outros fatores mais relevantes em jogo.
O problema da prata como subproduto: a armadilha da oferta
Aqui está o ponto que poucos entendem: a maior parte da prata é produzida como subproduto de minas de cobre, zinco e chumbo. São cerca de 70% da produção mundial. Isso cria um problema estrutural único.
Quando o preço do ouro sobe, os mineradores colocam mais máquinas para extrair ouro. Simples. Quando o preço da prata sobe, isso não acontece. A mineradora de zinco não vai aumentar a produção de zinco só porque a prata vale mais. A prata é apenas o “restinho” que sobra no processo.
É por isso que a oferta de prata enfrenta um défice estrutural há vários anos. A produção anual (830–850 milhões de onças) tem crescido pouco. O mercado não consegue responder rapidamente aos aumentos de demanda.
Essa característica torna a prata especialmente sensível a qualquer redução na oferta, mesmo que pequena. A reciclagem acrescenta alguma oferta, mas não é suficiente para colmatar o défice global. A combinação de oferta limitada com procura crescente cria as condições perfeitas para movimentos expressivos de valorização.
Déficit estrutural: números que não mentem
A tensão surge em um momento marcado por déficit estrutural no mercado de prata. A demanda global prevista para 2025 é de cerca de 1,24 bilhão de onças, enquanto a oferta estimada gira em torno de 1,01 bilhão de onças.
Os mercados globais de prata enfrentam um déficit estrutural pelo quinto ano consecutivo. A demanda para 2025 alcança 1,24 bilhão de onças enquanto a oferta totaliza apenas 1,01 bilhão de onças. Isso cria um déficit entre 100 e 250 milhões de onças.
Os estoques estão despencando. Os inventários da COMEX caíram 70% desde 2020. Os cofres de Londres mostram declínios de 40% no mesmo período. Os inventários de Xangai estão em mínimas de dez anos.
Algumas regiões mantêm apenas 30 a 45 dias de prata utilizável nas taxas atuais de consumo. É uma situação crítica que justifica a explosão dos preços.
Revolução tecnológica: as baterias que podem mudar tudo
Além do déficit, há uma revolução tecnológica em curso. Pesquisas apontam para o desenvolvimento de baterias de estado sólido baseadas em prata. Essas baterias não teriam partes líquidas, como as atuais, o que as tornaria muito mais eficientes.
Se essa tecnologia se mostrar viável comercialmente, a demanda por prata pode explodir de forma permanente. A demanda por semicondutores, IA e painéis solares transforma a prata em ativo-chave da nova economia industrial. A prata já é amplamente usada em circuitos integrados, mas as baterias representariam um consumo em escala completamente diferente.
A crescente utilização em painéis solares, veículos eléctricos e tecnologias ligadas à IA – sectores que registam investimentos pesados – acrescentou um apoio estrutural aos preços. Cada painel solar, cada carro elétrico, cada datacenter de IA precisam de prata para funcionar.
É especulação, mas especulação fundamentada em pesquisa real. E os mercados estão precificando essa possibilidade.
Fuga das moedas: quando o papel perde valor
O terceiro fator é a perda de confiança nas moedas fiduciárias. O cenário de incertezas globais impulsiona a busca por investimentos de segurança. O ouro e a prata se beneficiam de um crescimento mais lento da economia norte-americana e de uma taxa de juros mais baixa do Federal Reserve.
Na Índia, tradicionalmente um mercado forte para prata, o movimento é ainda mais intenso. O povo indiano está comprando prata como reserva de valor contra a inflação e a desvalorização da rupia. Um aumento significativo de prata física, impulsionado por investimentos de varejo e de indivíduos de alto patrimônio em produtos ETF, é apoiado por quase dois anos de demanda de consumo global.
O mesmo fenômeno acontece globalmente. A prata duplicou de valor em 2025, impulsionada por um défice estrutural de oferta, forte procura industrial e crescente desconfiança nas moedas fiduciárias. É a velha história: quando o dinheiro de papel perde credibilidade, as pessoas correm para o que é real e tangível.
O mercado em pânico: liquidez baixa e volatilidade extrema
O cenário de dezembro de 2025 foi especialmente explosivo. A prata não apenas tocou US$ 75 — continuou subindo em meio à baixa liquidez do feriado. A prata para entrega imediata subiu até 7,6% e cruzou US$ 77/oz, demonstrando como a descoberta de preços pode se mover rapidamente quando a liquidez é baixa e o momentum acelera.
Um dos aspectos mais importantes por trás do movimento do final de dezembro é o mercado físico da China, onde as dinâmicas locais parecem ter intensificado o aperto global. A prata atingiu preços recordes na China no dia de Natal enquanto a oferta física se apertou.
Em 24 de dezembro, o contrato Ag(T+D) de Xangai fechou a 17.714 yuan/kg, subindo 7,95% na sessão. Quando os preços à vista negociam acima dos futuros (uma condição frequentemente chamada backwardation), pode indicar aperto físico imediato: compradores estão dispostos a pagar mais agora em vez de esperar pela entrega posterior.
Segundo analistas da OANDA, jogadores orientados por momentum e especulativos impulsionaram o rally desde o início de dezembro, ajudados pela baixa liquidez de final de ano, dólar mais fraco, expectativas de corte de juros e tensões geopolíticas. É um coquetel explosivo.
As previsões para 2026: até onde pode ir?
Especialistas do mercado esperam que a prata seja negociada na faixa de 70-80 dólares por onça até março de 2026 e recomendam uma estratégia de “compra em baixas” nos níveis atuais.
As estimativas apontam para um preço médio de 65 USD/onça para 2026, com picos que podem atingir 70 USD/onça. Apesar de sinais de sobrecompra no curto prazo, o cenário para 2026 permanece construtivo.
Mas há riscos. Analistas alertam que a volatilidade inerente da prata justifica cautela nos níveis atuais. Quaisquer sinais de recessão nos EUA ou preocupações renovadas sobre uma bolha de mercado liderada pela IA podem desencadear fortes retrações nos preços.
O déficit de oferta provavelmente persistirá até 2026–27, embora os ganhos possam ser mais moderados do que os observados em 2025. Mesmo assim, a tendência de longo prazo permanece altista.
O que isso significa para você
Se as baterias de estado sólido com prata se tornarem realidade comercial, prepare-se. O preço da prata pode subir muito mais do que os níveis atuais. Uma cotação sustentada acima de US$ 50 pode representar uma redefinição do papel econômico da prata e de seu valor real.
Para investidores, a prata está se comportando como um ativo híbrido: reserva de valor em momentos de incerteza, mas também insumo industrial escasso em cadeias de suprimento apertadas. A prata está se tornando cada vez mais o “termômetro” do mercado: um metal que se comporta como porto seguro em momentos de aversão ao risco, mas também negocia como um insumo industrial escasso quando as cadeias de suprimento se apertam. No final de 2025, ambas as forças estão acontecendo ao mesmo tempo.
O governo não consegue imprimir prata. Não consegue criar prata do nada. E com a demanda industrial crescendo e a oferta limitada pela natureza do processo produtivo, estamos vendo o livre mercado funcionando em sua forma mais pura: oferta e demanda determinando preço.
A pergunta que fica é: com déficits estruturais, revolução tecnológica e fuga das moedas fiduciárias, até onde a prata pode subir? O mercado ainda está descobrindo a resposta.

