
Em 2018, a Receita Federal criou uma lista de 133 agentes públicos com patrimônio incompatível e inconsistências graves. Entre os nomes estavam as esposas de Gilmar Mendes e Dias Toffoli. O que aconteceu depois revela como três ministros do STF se uniram para proteger seus próprios interesses.
A operação da Receita usava um software que cruzava diferentes bancos de dados para identificar suspeitas de lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio. O critério era objetivo: agente público conhecido, patrimônio familiar superior a 5 milhões, mais de R$ 100 mil em espécie declarados e recebimento de mais de 2,5 milhões em dividendos.
Guomar Mendes, esposa de Gilmar Mendes, e Roberta Rangel, esposa de Toffoli, se encaixaram perfeitamente nos critérios. Os auditores começaram a investigar os clientes dessas advogadas, questionando os contratos milionários e os serviços prestados.
Foi aí que começou a articulação para frear as investigações. O que parecia ser uma operação técnica da Receita se transformou em caso político de primeira grandeza.
O inquérito das fake news como cortina de fumaça
Alexandre de Moraes encontrou a solução perfeita para proteger os colegas. Dentro do inquérito das fake news, avocou o caso para si e determinou a imediata paralização das investigações. A justificativa oficial era proteger as instituições democráticas.
Na prática, Moraes afastou dois auditores da Receita Federal, violando tratados internacionais segundo críticos da época. Os servidores concursados tiveram que entregar identificação funcional, notebooks de trabalho e tokens de acesso. Tudo para interromper uma investigação técnica que seguia critérios objetivos.
A operação funcionou como previsto. A imprensa se concentrou na narrativa de perseguição aos bolsonaristas, enquanto as investigações de corrupção eram discretamente arquivadas. O inquérito das fake news se tornou o escudo perfeito para proteger interesses particulares.
Os auditores que ousaram investigar esposas de ministros foram punidos e afastados. A mensagem ficou clara: existe foro privilegiado na Receita Federal, sim. Basta ter conexões no Supremo.
Toffoli e as ligações perigosas com o Banco Master
O caso ganhou novos contornos com as revelações sobre o Banco Master. Toffoli viajou para a final da Libertadores com advogado do caso, numa coincidência que impressiona pela falta de discrição. Segundo a defesa, eram apenas torcedores gritando no avião.
Curiosamente, logo após essa viagem, Toffoli puxou todo o caso do Banco Master para o STF, colocou sigilo em tudo e liberou os envolvidos. Uma sequência de decisões que desafia qualquer explicação baseada em coincidência.
Mas as conexões não param aí. Roberta Maria Rangel, esposa de Toffoli, foi sócia do escritório Ward Advogados em março de 2021. Esse mesmo escritório defende o Banco Master. Ela saiu justamente quando o banco contratou a empresa de Alexandre de Moraes.
A troca de advogados sugere uma estratégia bem articulada. Perceberam que no STF uns têm mais influência que outros e ajustaram a tática. Toffoli saiu, Moraes entrou, mas os dois continuam envolvidos na mesma trama.
Alexandre de Moraes assume o protagonismo
Com Toffoli queimado pelas viagens suspeitas, coube a Alexandre de Moraes assumir a linha de frente da operação de proteção mútua. Sua empresa foi contratada pelo Banco Master numa demonstração de como o sistema funciona na prática.
Moraes já havia dado provas de lealdade ao grupo ao paralisar as investigações de 2018. Agora recebia a recompensa financeira por serviços prestados. O esquema se mostrava sustentável e lucrativo para todos os envolvidos.
A defesa de Moraes pelos colegas não é casual. Gilmar Mendes foi o único ministro do STF a defendê-lo publicamente no caso do Banco Master. Também defendeu Toffoli. Nenhum outro colega da Corte saiu em defesa dos dois.
Isso sugere que o restante do STF vê o trio com desconfiança. Mas criticar publicamente seria pior ainda, então preferem o silêncio. Quem defende, defende por interesse próprio.
Gilmar Mendes completa o trio da corrupção
Gilmar Mendes tem motivos pessoais para manter a união do grupo. Sua esposa também estava na lista de 2018 da Receita Federal. Qualquer investigação séria sobre tráfico de influência no STF acabaria chegando até ele.
Por isso Gilmar foi o único a defender tanto Toffoli quanto Moraes nos casos recentes. Sabe que se um cair, todos caem juntos. A estratégia de defesa mútua se tornou questão de sobrevivência política.
As conexões entre os três remontam ao período da investigação da Receita. Não é coincidência que sejam exatamente esses ministros envolvidos em escândalos recentes. A ligação vem de longe e se fortaleceu ao longo do tempo.
Recentemente, Gilmar se divorciou da esposa que constava na lista suspeita de 2018. Uma forma de distanciamento que chama atenção pelo timing. Os problemas estão se acumulando e as estratégias de proteção precisam se adaptar.
A democracia como pretexto para a corrupção
A genialidade do esquema foi usar a defesa da democracia como justificativa para perseguir opositores. Criaram um inquérito supostamente para proteger as instituições, mas na prática blindaram interesses particulares.
Bolsonaro e seus apoiadores serviram como bodes expiatórios perfeitos. Enquanto a mídia se concentrava na narrativa golpista, as investigações de corrupção eram arquivadas sem alarde. A opinião pública aplaudia, sem perceber o jogo.
Agora, com Bolsonaro preso e os generais afastados, qual será a próxima justificativa? Como explicar a perseguição aos auditores da Receita que investigaram corrupção? O discurso da defesa democrática perdeu sua utilidade.
A estratégia funcionou por anos, mas chegou ao limite. As investigações sobre o Banco Master recolocaram o foco na corrupção dos ministros. A cortina de fumaça se desfez e a realidade apareceu.
O exemplo chileno que incomoda
Em 2025, três ministros da Suprema Corte Chilena sofreram impeachment. Um deles havia viajado em avião particular de advogado que atuava em processo sob seu julgamento. O Senado chileno considerou o comportamento incompatível com a imparcialidade judicial.
A semelhança com o caso Toffoli é gritante. Lá fora, comportamentos suspeitos têm consequências. Aqui no Brasil, a conta parece não chegar nunca. Mas as evidências se acumulam e a pressão aumenta.
Três ministros chilenos, três ministros brasileiros. A coincidência numérica impressiona, mas a diferença nas consequências revela muito sobre nosso sistema de justiça. No Chile, há responsabilização. No Brasil, há blindagem.
As ligações perigosas entre Toffoli, Moraes e o Banco Master arriscam o que resta da credibilidade do STF, como notou o Estadão. Mas que credibilidade? Para quem ainda acompanha os fatos, ela já se perdeu há muito tempo.
O sistema brasileiro de proteção mútua entre poderosos continua funcionando. Mas por quanto tempo? As investigações retomaram força e as evidências se multiplicam. Uma vez corrupto, sempre corrupto – e sempre investigável.
Com Bolsonaro neutralizado, voltou a investigação de corrupção que tentaram esconder. O INSS já mostra novos casos envolvendo o governo atual. A roda da corrupção brasileira não para de girar, apenas muda de direção conforme a conveniência política.
Resta saber se a sociedade brasileira está disposta a exigir o mesmo padrão de responsabilidade que vemos no Chile. Ou se continuaremos assistindo passivamente enquanto a Suprema Corte se transforma em balcão de negócios privados.

