
A Câmara dos Deputados derrubou o limite de 2% para o imposto sobre bebidas açucaradas, parte da polêmica reforma tributária do governo Lula. O deputado Chico Alencar comemorou a medida nas redes sociais, sem perceber que está celebrando o encarecimento de produtos básicos para quem tem menos dinheiro.
O chamado “imposto do pecado” agora pode ter qualquer valor que o governo decidir aplicar. Antes, havia um teto de 2% para proteger o consumidor. Agora, não existe mais limite. O resultado é previsível: quem ganha pouco vai pagar mais caro por refrigerantes, sucos industrializados e outras bebidas.
Segundo pesquisas citadas pelos próprios defensores da medida, o consumo de ultraprocessados cresce principalmente entre negros, indígenas e habitantes de regiões pobres do Brasil. O motivo é simples: são mais baratos que os alimentos considerados saudáveis. A resposta do governo? Tornar os produtos baratos ainda mais caros.
O que está no imposto do pecado aprovado
A lista do imposto seletivo, como é oficialmente chamado, inclui três categorias principais. Tabaco e derivados terão tributação maior, o que significa cigarro mais caro para quem já luta para largar o vício. Bebidas alcoólicas também entram na mira, afetando desde a cerveja do fim de semana até destilados.
A terceira categoria são as bebidas adoçadas: refrigerantes, refrescos, néctares, chás prontos, isotônicos. Qualquer produto que ofereça praticidade para fazer um “suquinho baratinho” agora custará mais caro. A alternativa para quem tem pouco dinheiro se resume a água ou sucos naturais que demandam tempo e dinheiro extra.
O mais irônico é que Chico Alencar postou uma foto com Coca-Cola Zero para celebrar a medida. Acontece que produtos zero açúcar não entram no imposto, segundo a própria legislação. Apenas bebidas com adição de açúcar são tributadas. O deputado comemorou sem nem conhecer a lei que ajudou a aprovar.
Para quem pode pagar uma empregada doméstica, como provavelmente Alencar, é fácil mandar buscar frutas na feira e preparar sucos naturais. Para quem trabalha o dia todo por um salário mínimo, essa não é uma opção realista.
A matemática cruel das calorias baratas
Existe uma realidade que políticos ricos preferem ignorar: o ser humano precisa de um número mínimo de calorias para sobreviver. Para quem tem dinheiro, diminuir calorias é questão de estética. Para quem vive na base da pirâmide social, conseguir calorias suficientes é questão de sobrevivência.
Os ultraprocessados são consumidos pelos pobres por dois motivos fundamentais: são baratos em dinheiro e baratos em tempo. Uma Coca-Cola oferece calorias rápidas por pouco dinheiro. Um suco de abacaxi natural exige comprar a fruta, descascar, processar – tempo que quem trabalha muito para ganhar pouco simplesmente não tem.
A conta é simples: se você considera o custo por caloria, refrigerantes e produtos industrializados oferecem energia barata. Macarrão, biscoito, Coca-Cola – esses são os alimentos que permitem ao trabalhador de baixa renda manter as forças para mais um dia de trabalho.
Quando o governo encarece esses produtos, não está atingindo as grandes empresas. Está tirando opções de quem já tem poucas. A Coca-Cola não vai quebrar – vai simplesmente repassar o imposto para o preço final.
Por que não baratear o saudável ao invés de encarecer o barato
A lógica seria óbvia: se alimentos saudáveis são mais caros que ultraprocessados, a solução inteligente seria reduzir impostos sobre frutas, verduras e produtos naturais. Mas essa não é a escolha do governo federal.
Prefere-se punir quem consome produtos baratos a facilitar o acesso aos produtos saudáveis. É mais fácil arrecadar com imposto novo do que abrir mão de receita tributária. O resultado prático é que o trabalhador paga a conta duas vezes: com menos opções e preços maiores.
As próprias pesquisas mostram que ultraprocessados são consumidos pelos pobres “em virtude dos preços mais baratos que os alimentos saudáveis”. Se o diagnóstico está correto, por que a receita é encarecer ainda mais a vida de quem ganha pouco?
A resposta revela muito sobre as prioridades reais: arrecadação importa mais que justiça social. É mais simples criar imposto novo que reformar a estrutura tributária que sobrecarrega alimentos básicos.
O ultraprocessado como salvação, não maldição
Para quem nunca precisou escolher entre comer e pagar conta, é fácil demonizar alimentos industrializados. A realidade de quem vive com pouco dinheiro é diferente. O ultraprocessado muitas vezes representa a diferença entre comer e passar fome.
Peixe fresco exige tempo para limpar, conhecimento para preparar, dinheiro para comprar. Nuggets de peixe oferecem proteína pronta, barata e rápida. Para quem trabalha doze horas por dia, essa praticidade não é luxo – é necessidade.
O mesmo vale para outros exemplos: espiga de milho versus salgadinho, abacaxi fresco versus suco industrial. O produto natural sempre demanda mais tempo, mais trabalho, mais conhecimento culinário. Recursos que quem luta para sobreviver economicamente não tem em abundância.
Criminalizar essas escolhas é criminalizar a pobreza. É exigir que quem tem menos dinheiro também tenha menos praticidade, menos comodidade, menos opções.
A reforma tributária como bomba social
O imposto sobre bebidas açucaradas é apenas uma amostra do que vem pela frente com a reforma tributária. O sistema todo foi desenhado para arrecadar mais, não para simplificar ou tornar a vida mais barata.
A reforma começa a valer em 2027 e promete encarecer praticamente tudo. Quando não existe limite para impostos seletivos, o governo pode aplicar qualquer percentual que quiser. Nada impede que sejam 50%, 100% ou 200% sobre produtos que a população de baixa renda mais consome.
Defensores da medida falam que “a Coca-Cola vai pagar o imposto”. Mentira. Empresas não pagam impostos – repassam para o consumidor final. Quem vai pagar é o trabalhador que ganha pouco e quer tomar um refrigerante no fim de semana.
O mais perverso é ver políticos comemorarem isso como vitória social. Como se encarecer a vida dos pobres fosse favor para os pobres.
O Justo Veríssimo sarcástico da vida real
Existe uma comparação perfeita para entender a esquerda brasileira atual: o personagem Justo Veríssimo, do humorista Chico Anísio. Era um político que odiava pobres, mas pelo menos tinha a honestidade de admitir. “Eu odeio pobre. Quanto mais pobre, mais eu odeio”, dizia o personagem.
A diferença é que Justo Veríssimo era honesto sobre suas intenções. A esquerda atual age como Justo Veríssimo sarcástico: finge amar o pobre enquanto aprova leis que tornam a vida dele mais difícil. Fala em justiça social enquanto tira opções de consumo de quem já tem poucas.
Quando Chico Alencar comemora o encarecimento de bebidas que pobres consomem, está fazendo exatamente isso. Fingindo que prejudicar é ajudar. Disfarçando crueldade de bondade.
O personagem era ficção. A hipocrisia é real e está aprovada no Congresso Nacional.
A pergunta que não quer calar: até quando vamos aceitar que políticos decidam o que pobres podem ou não consumir, sempre encarecendo suas poucas opções?


